segunda-feira, 6 de junho de 2011

Uma história de bailarina

Conversando com uma pessoa que conhecia em Curitiba, fiquei conhecendo, também, a história de uma bailarina chamada Mônica Infante. Quem sabe vocês já ouviram falar dela.

"Bom, vamos ao que interessa. Eu, musa "fracassada" dos anos 80.

Desde que resolvi ser uma "bailarina de verdade", percebi que teria que enfrentar um árduo caminho para ter a aparência certa, isto é , ter um corpo perfeito, isto é, ser magra, muito magra, bem magra. Pratiquei vôlei e ginástica olímpica durante muitos anos da adolescência e por isso tinha um corpo forte e atlético. Não era gorda, apenas "gostosa", como ouvia sempre. Mas, com a decisão de sair de Juiz de Fora e ir para o Rio me dedicar a dança, a neurose das dietas começaram. Fiz todos os regimes que você possa imaginar. Dos mais loucos aos mais "saudáveis", como aqueles que envolviam uma outra filosofia de vida - a macrobiótica, por exemplo - a fim de obter o "corpo perfeito".

Quando cheguei em Londres, em janeiro de 1985, estava magérrima e cheia de vontade de "vencer". Após diversas audições, fui aceita para o curso que me tornaria uma "bailarina de verdade". Tudo estaria bem se, após 6 meses em Londres, eu não tivesse engordado 8 quilos. Isso punha em risco minha bolsa de estudos na London Studio Centre e também os exames para a Royal Academy of Dancing.

Recomecei a loucura das dietas. Ouvia falar de alguma e já ia fazendo. Porém, sabe-se lá por quais motivos, meu corpo se recusava a obedecer as ordens para perder peso. Das professoras e das companheiras de curso os textos eram sempre os mesmos: "Muito talentosa e dedicada. Olha como ela é flexível e 'en dehor'. Que 'expressão' quando dança. Porém, contudo, todavia, está tão gordinha, aliás, bem gorda. Deve dar para as aulas de contemporâneo e de flamenco". Meu grande sonho, a arte de dançar queria ficar para trás.

Eu adorava as aulas de contemporary e classical spanish, mas queria ser "uma bailarina de verdade", uma profissional da dança clássica. Meu treinamento mental e corporal era esse. Toda minha obsessão trabalhava nesse sentido.

O processo da bulimia chegou sem eu perceber. Em um processo de "emburrecimento", com tudo ficando menos esclarecido. De repente eu me vi em um canal tão maluco e alucinado que tinha certeza que só eu em todo o mundo estava passando por aquilo. Aliás, pensei que fosse eu que tivesse bolado o lance de vomitar. BINGO!!!! Tinha achado a fórmula mágica para poder comer, comer e comer e nunca mais engordar. Era fácil. Eu comia e ia ao banheiro. Enfiava a mão na garganta e vomitava. Tinha vezes que chegava a desmaiar. Só que não sabia que tinha desmaiado. Resultado: fraqueza, junto com uma depressão violenta e um corpo deformado tamanho o inchaço.

As regras eram simples: é PROIBIDO comer na frente das pessoas e é preciso mostrar desprezo por comida. Mesmo que sinta muita vontade, faça ar superior e diga que não entende porque todos querem que coma se não sente a mínima vontade. E o grande segredo e auto-punição para esse ar blasé é comer escondida bem sozinha no quarto do "hostel". Cardápio preferido: muito carboidrato. biscoitos maravilhosos, chocolate e muito cereal com leite. Depois - é lógico -, uma bela vomitada e tudo resolvido.

Gradualmente fui piorando até que o dentista com quem eu trabalhava nos weekends teve a sacada do que me acontecia e me deu um livro chamado BULIMIA. Nunca tinha ouvido falar nesse treco.Que coisa doida é essa? Fui para casa as 9pm e só parei de ler quando acabei a última página, na manhã seguinte. Estava em frangalhos.
- MEU DEUS! Não sou só eu!!!!!

Foi aí que eu saquei que estava realmente DOENTE, SERIAMENTE DOENTE, e que poderia até morrer. Porém, entre saber e tomar uma providência aconteceu um longo processo de resistência, vergonha e revelação.

Comuniquei-me com um conhecido psicanalista aqui no Brasil, que me recomendou um colega bem famoso em Londres. E lá fui (no pounds, just myself). Quando o cara me viu, ele percebeu que era muito grave e como eu não tinha dinheiro para bancar a consulta dele e meu inglês já era legal, ele me mandou para uma inglesa, sua parceira, que teve interesse em "salvar a minha vida de bailarina de verdade".

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